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REFLETIR, PLANIFICAR E

S A B E R & E D U C A R 3 0 / 2 0 2 1 : O P R E S E N T E D O F U T U R O D A I N F Â N C I A

AVALIAR O ESPAÇO

Jéssica Monteiro

Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti


Leonor Ortigão Rocha

Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti*


Mafalda Morato

Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti*


Maria Clara Costa

Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti*


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*Estudantes do Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º Ciclo do Ensino Básico



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Resumo:


O presente artigo, desenvolvido por estudantes do Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º. Ciclo do Ensino Básico, da Escola Superior de Edu- cação de Paula Frassinetti, visa evidenciar a im- portância da planificação e da avaliação do espa- ço em Educação Pré-Escolar e a sua contribuição para o crescimento pessoal e social das crianças. Para tal, consideramos pertinente focar em aspetos que devem ser tidos em conta na planificação e avaliação do espaço, interior ou exterior, sendo que relativamente ao espaço exterior iremos salientar a Mud Kitchen, re- ferindo os benefícios e as potencialidades da mesma, uma vez que este espaço foi observado, pelas autoras, em contexto de Prática de Ensino Supervisionada em Educação Pré-Escolar.


Palavras-chave:

S A B E R & E D U C A R 3 0 / 2 0 2 1 : O P R E S E N T E D O F U T U R O D A I N F Â N C I A

Pré-Escolar; Educador; Espaço; Planificação; Avaliação.


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DATA DE RECEÇÃO: 15/09/2021

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DATA DE ACEITAÇÃO: 09/12/2021

Abstract:


This article, developed by students of the masters course Mestrado em Educação Pré-Escolar e Ensino do 1º. Cic- lo do Ensino Básico, from the higher education school Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, aims to highlight the importance of planning and evaluating space in Early Childhood Education and its contribution to the personal and social growth of children.

To do this, we consider relevant to focus on the aspects that should be taken into account in the planning and evaluation of space in a Early Childhood Education set- ting, both indoors and outdoors, being that regarding the outdoor space we will highlight the Mud Kitchen, referring to its benefits and potential, as this space was observed, by the authors, in their supervised teaching practice in Early Childhood Education.


Keywords:

Early Childhood Education; Early Child- hood Educator; Space; Planning; Evaluation.


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Introdução

A reflexão deste artigo visa trazer à luz conheci- mentos e análises concedidos pelas experiências vi- venciadas no decorrer da prática profissionalizante das autoras, na valência de Educação Pré-Escolar, no ano letivo de 2020/2021.

Com a oportunidade de viver e explorar a realida- de educativa no campo da Educação Pré-Escolar, foi possível descobrir, de forma mais aprofundada, todo o trabalho prático e teórico expectável de um profissional de educação nesta valência. Por conse- guinte, as formandas adquiriram e desenvolveram uma variedade de saberes, habilidades e competên- cias imprescindíveis para a sua formação.

Uma das principais dimensões que diz respeito à Educação de Infância, que se destacou para as autoras, atende à componente da organização do ambiente educativo, nomeadamente, a organiza- ção do espaço. Tal acontece uma vez que se suce- deu, no decorrer do estágio em questão, a notória compreensão da influência que este interveniente exerce tanto na prática do educador como nas expe- riências e nas aprendizagens vividas e conquista- das pelas crianças.

Como futuras profissionais, é essencial entender que, no que concerne a Educação de Infância, o modo como é feita a gestão do ambiente educati- vo impacta diretamente o processo de educação da criança, já que se depreende que a organização do espaço e a disposição dos materiais que nele se en- contram, influenciam diretamente a quantidade, a qualidade e o género de aprendizagens que esta

poderá desenvolver. Importa assim que o educador se questione relativamente a esta componente, na medida em que a intenção com que a planeia e or- ganiza deve ser feita de acordo não somente com as competências que pretende potenciar, mas tam- bém levando em consideração as necessidades e a evolução do grupo de crianças a seu encargo.

Neste seguimento, espera-se que exista, na prática do educador, uma permanente consciência da im- prescindibilidade de planificação e avaliação cons- tantes do espaço, no que diz respeito à sua organi- zação, utilização e aproveitamento, tendo em vista uma intervenção educacional significativa que vise verdadeiramente estimular e potenciar o desenvol- vimento da criança, objetivando sempre o seu bem-

-estar e sucesso. Assim, a atenção intencional que o profissional de educação confere ao espaço poderá

traduzir-se na implementação de uma prática edu- cativa deveras relevante e diferenciadora.

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Pretende-se, deste modo, que o artigo em questão se preste como partilha de uma reflexão contínua que as formandas foram tecendo no decorrer da sua prática profissionalizante, com foco na análise do espaço enquanto parceiro primordial na prática do educador de infância.


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O espaço

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A organização do ambiente educativo é um fator pri- mordial para o desenvolvimento das crianças. Criar um ambiente adequado “(…) não se trata de ensinar, no sentido convencional (…)”, mas sim de “(…) criar ambientes ricos e estimulantes que permitam, e po- tenciem, o desenvolvimento global de todas as crian- ças” (Zabalza, 1992, p. 123). Assim, quando o educa- dor reflete acerca do espaço educativo, deve ter em consideração as aprendizagens que pretende que as crianças alcancem com a exploração do mesmo. Deste modo, deve interrogar-se acerca da sua função, fina- lidades e utilização. Para fundamentar as razões da organização do espaço, deve proceder à reflexão, à pla- nificação e à avaliação.


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Espaço Interior

O espaço sala revela as intenções do educador. A sua organização deve basear-se em princípios, que se en- contram elencados, tanto nas Orientações Curricu- lares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE) como nos documentos matriciais da instituição onde o educador desenvolve a sua prática. De acordo com o Decreto-Lei 241/01, “O educador de infância concebe e desenvolve o respetivo currículo, através da planificação, organi- zação e avaliação do ambiente educativo, bem como das atividades e projetos curriculares, com vista à construção de aprendizagens integradas” (Decreto-Lei nº 241/01). Assim sendo, o educador de infância “(…) organiza o espaço e os materiais, concebendo-os como recursos para o desenvolvimento curricular, de modo a proporcionar às crianças experiências educativas in- tegradas” (Decreto-Lei nº 241/01).

Adicionalmente, como refere Zabalza (1998), “O es- paço na educação é constituído como uma estrutura de oportunidades” (Zabalza, 1998, p. 120). Ou seja, “É uma condição externa que favorecerá ou dificultará o processo de crescimento pessoal e o desenvolvimen- to das atividades instrutivas” (Zabalza, 1998, p. 120). Neste sentido, o educador deve observar o grupo, com- preendendo as suas necessidades, escutar a opinião de cada uma das crianças, percebendo os seus interesses, de modo a conseguir conceber um espaço adaptado ao grupo.

No que diz respeito à organização do espaço sala, se- gundo Hohmann & Weikart (2007), este “(…) deve ser atraente para as crianças (…)” e estar “(…) dividido em áreas de interesse bem distintas de modo a encorajar diferentes tipos de brincadeira” (Hohmann & Wei- kart, 2007, p. 164) (ver fotografia 1).


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Fotografia 1 – Sala dividida por áreas


Estas áreas de interesse, configuração comum em sa- las de atividades de Educação Pré-Escolar, devem “(…) assegurar a visibilidade e possibilidade de locomoção entre diferentes espaços (…)” (Hohmann & Weikart, 2007, p. 170), estar “(…) suficientemente flexíveis para se acomodarem a aspetos práticos e aos interesses móveis e instáveis das crianças (…)” (ibidem, p. 171) e organizarem-se “(…) de forma a ter em conta aspe- tos práticos, bem como as mudanças de interesse das crianças nas atividades (…)” (ibidem, p. 163). Estas áreas devem ainda ser sempre identificadas com algo que as caraterize, dando prioridade às crianças de ex- pressar como será feita esta identificação para que se revelem ativas neste processo (ver fotografia 2).


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Fotografia 2 – Área de pintura identificada


Este tipo de organização concede a oportunidade de “(…) promover a escolha das crianças (…)” (Oliveira-Formosi- nho, 1998, p. 157) e permite que as mesmas atuem “(…) de forma independente e com o máximo controle pos- sível sobre o ambiente que as rodeia (…)” (Hohmann, Banet & Weikart, 1984, p. 51). Efetivamente, as áreas disponíveis em sala permitem às crianças explorar, de modo individual, a pares ou em grupo, múltiplos recur- sos favorecedores da aquisição de novos conhecimen- tos e capacidades. Assim sendo, é fundamental que os espaços pedagógicos sejam organizados, flexíveis, se- guros, lúdicos, serenos, ou seja, um lugar que integre intencionalidades múltiplas, nomeadamente, o desen- volvimento do sentimento de pertença e a participação através de momentos de experiência e de comunicação. Este espaço deve ser considerado não só para o grupo de crianças, mas para cada elemento, onde seja possível brincar, trabalhar e fazer pausas, revelando-se adicio- nalmente como um lugar que acolhe diferentes ritmos, identidades e culturas (ver fotografia 3).


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Fotografia 3 – Crianças a jogar com setas


No que diz respeito aos materiais, de acordo com as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Esco- lar (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016), a sua seleção “(…) deverá atender a critérios de qualidade e varieda- de, baseados na funcionalidade, versatilidade, dura- bilidade, segurança e valor estético” (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016, p. 26). Deste modo, os profissionais de educação devem ter em consideração a diversidade de recursos que disponibilizam, para dar resposta não somente às competências estabelecidas nas OCEPE, enquanto fundamentais de adquirir em idade Pré-Es- colar, como também às curiosidades e às necessidades das crianças do grupo de sala.

Compreendendo assim a influência quer da organi- zação da sala como um todo, quer da disposição de materiais e recursos, é de sublinhar que ambos estes aspetos devem ser levados em consideração, pelo edu- cador de infância, aquando da planificação do espaço sala pelo mesmo.

Assim, ao realizar o planeamento de espaços e de materiais, o educador deverá ter em consideração as necessidades afetivas, de autonomia, de movimento, de socialização, de descoberta, de exploração e de co- nhecimento das crianças (Filgueiras, 2010, p. 52); os materiais existentes e a forma como estão dispostos, uma vez que condicionam o que as crianças podem fazer e aprender (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016,

p. 26) e o facto de a necessidade do planeamento em questão dever ser uma ação partilhada e conjunta com o grupo, num ambiente onde se possa expor, debater e negociar ideias (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016,

p. 24). Posto isto, é fundamental que o educador de infância, no início e no decorrer do ano letivo, seja ca- paz de refletir e avaliar todos os elementos relativos ao espaço. Esta avaliação objetiva um melhoramento da qualidade do processo de aprendizagem das crianças.

Podem ocorrer transformações na sala determinadas por diversos motivos, desde preocupações organiza- cionais a mudanças necessárias efetuar por conta de, por exemplo, evolução de múltiplos interesses que surjam por parte das crianças e por possíveis projetos de sala. Assim, o espaço sala estará em constante mu- dança, tendo em conta o grupo que o frequenta.

Pelos mesmos motivos elencados anteriormente, também os recursos dispostos nas áreas podem sofrer constantes alterações, visto que se podem acrescen- tar ou substituir materiais consoante as necessidades sentidas pelas crianças, como estas últimas podem expressar desejar criar algo novo para as áreas de inte- resse, entre outros motivos. Deste modo, o educador revela-se como um elo importante nesta tarefa, uma vez que necessita estar sempre atento às carências de- monstradas pelas crianças em relação aos materiais que se encontram disponíveis no ambiente educativo. Após estas necessidades serem apuradas, o educador deve considerar qual a melhor opção de material.

Parte fulcral da sala são também as paredes, que não devem ser descuradas, visto que estas se constituem como “(…) uma forma de comunicação, que sendo re- presentativa dos processos desenvolvidos, os torna vi- síveis tanto para crianças como para adultos” (Silva, Marques, Mata & Rosa, p. 26) (ver fotografia 4).


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Fotografia 4 – Atividade afixada na parede da sala


Com efeito, numa sala de Educação Pré-Escolar, poderá ser frequente a alteração dos trabalhos apresentados em placares nas paredes, sendo estes modificados de acordo com as produções e as atividades que as crianças realizam, bem como conforme datas e épocas a celebrar (ver fotografia 5).


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Fotografia 5 – Trabalhos das crianças afixados na parede da sala


Com o surgimento da necessidade de implementar modificações, importa, após a realização destas, “no- vamente fazer a observação e a avaliação das mesmas, de modo a compreender se as alterações estão a surtir o efeito desejado. Caso não estejam, implica que haja novas transformações no espaço (Morgado, 2015, pp. 30-31).

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Em suma, é necessário pensar o espaço interior para que nele se consigam desenvolver não somente apren- dizagens significativas, mas também interações com os vários intervenientes do dia a dia das crianças e das suas rotinas. Estando este espaço planeado da melhor forma, de acordo com as necessidades e os interesses revelados pelo grupo de crianças, o referido espaço irá autenticamente potenciar as atividades e as experiên- cias das mesmas, permitindo-lhes viver aprendiza- gens deveras ativas.


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Espaço Exterior

Sendo as OCEPE um documento orientador desta va- lência, nestas destaca-se também o espaço exterior no seu enquadramento geral, mais especificamente no que diz respeito à organização do ambiente educativo. Desta forma, segundo as OCEPE, o espaço exterior é igualmente um espaço educativo, uma vez que apre- senta uma variedade de potencialidades e característi- cas que possibilitam enriquecimento e diversificação de oportunidades (ver fotografia 6).


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Fotografia 6 – Criança a brincar no exterior


Este proporciona o desenvolvimento de diversas formas de interação social e de contacto, bem como a exploração de materiais naturais, sendo por isso um local que favorece as atividades da iniciativa da criança. Além de proporcio- nar este contacto, alguns materiais podem ser incluídos na sala do grupo com o objetivo de serem explorados.O espaço exterior possibilita ainda que as crianças desenvol- vam atividades físicas entre as quais correr, trepar, saltar e fazer diferentes tipos de jogos (ver fotografia 7).


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Fotografia 7 – Espaço exterior

No entanto, a utilização deste espaço implica sempre que o/a educador/a reflita acerca das suas potenciali- dades e que a organização do referido espaço seja cui- dadosamente pensada, sobretudo no que se refere à introdução de materiais e equipamentos que apelem à criatividade e imaginação, tendo sempre em conta critérios dequalidade e questões de segurança (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016, p.27).

Durante a Prática de Ensino Supervisionada em Edu- cação Pré-Escolar, vivida pelas autoras, foi possível es- tas experienciarem contacto com uma área exterior, não antes explorada pelas mesmas, a Mud Kitchen, em português, Cozinha de Lama (ver fotografia 8).


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Fotografia 8 – Criança a brincar na Mud Kitchen


Quando frequentavam este espaço, as crianças uti- lizavam um equipamento específico que incluía fato impermeável, galochas e chapéu. Como elemento base para a Mud Kitchen é utilizada lama, que resul- ta da combinação de água e solo. Estes ingredientes são considerados essenciais para o espaço em ques- tão. Além da água ser um ingrediente fundamental para a criação de lama, é uma componente que pro- voca grande interesse por parte das crianças. Este in- teresse pode ser explicado pelo facto de, neste espa- ço, a sua utilização ser mais fácil, fazendo com que a criança tenha uma zona de ação maior e alcance competências de autonomia e autorregulação. Esta utilização deve ser sempre feita com responsabilida- de tendo em conta a preservação do ambiente (Bento & Dias, 2017, p. 184). Adicionalmente, a Mud Kitchen inclui materiais de interior de casa e objetos de vida doméstica, que acabam por ser enriquecidos devido ao local em que se encontram (White, 2014, p. 6) (ver fotografia 9 e 10).

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Fotografia 9 – Crianças brincam com travessas Fotografia 10 – Crianças brincam com tachos e panelas


A recolha e arrumação de materiais é também traba- lhada com as crianças (ver fotografia 11):


Comecei por sentá-los à volta e questionei-os sobre o que eram [objectos trazidos pelas crianças], como é que nós os podíamos usar na cozinha de lama e como é que os podíamos organizar. As respostas dadas cor- responderam logo ao que se pretendia e iniciamos en- tão o agrupamento dos elementos. O grupo foi capaz de identificar alguns dos elementos e depois também agrupá-los e colocá-los na caixa correta. Na quinta-

-feira conseguimos ir à cozinha de lama, e foi, mais uma vez, notório o entusiasmo por conseguirem ter todos aqueles elementos na cozinha de lama. Estes foram usados pela maior parte das crianças enquanto

lá estiveram, sendo utilizadas com o propósito preten- dido, dando uma maior riqueza às suas brincadeiras. (excerto de registo de observação)


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Fotografia 11 – Organização de alguns materiais recolhidos pelas crianças


Ainda referente aos materiais e elementos disponí- veis, estes devem ser diferentes, de maneira a garan- tir o apoio na ação da criança e a mobilização de com- petências. É importante que exista um fácil acesso aos materiais, promovendo a autonomia das crianças, bem como da sua movimentação. No que concerne à qualidade e quantidade dos recursos, é fulcral avaliar-

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-se os mesmos de forma persistente, sendo necessário retirar aqueles que já não se encontram em bom es- tado e também os que já não demonstram utilidade, substituindo-os por outros materiais que satisfaçam carências que possam surgir. Esta dinâmica envolve, novamente, as crianças:


O grupo demonstrou a vontade de ter alguns mate- riais naturais ao seu dispor. Dessa forma, foi pedido para trazerem alguns elementos recolhidos para utili- zarem na cozinha de lama. (Excerto de registo de ob- servação)


A sua arrumação e limpeza deve ser flexível. É tam- bém principal que o espaço esteja organizado, para que o brincar decorra nas melhores condições, ainda assim, não são necessários que os materiais se encon- trem sempre limpos e ordenados. Este facto pode ser explicado por contribuírem para o fomento do pen- samento criativo e divergente e também porque as crianças atribuem diversos significados aos objetos, adaptando-os a determinadas atividades e interesses (Bento & Dias, 2017, pp. 186-187) (ver fotografia 12).

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Fotografia 12 – Arrumação dos materiais


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Este espaço em específico caracteriza-se ainda pela sua flexibilidade e simplicidade, não havendo assim uma única forma de organização do mesmo e dos materiais neste inseridos, sendo tal ajustável (Bento & Dias, 2017, p. 183). É suposta a utilização da Mud Kitchen durante todo o ano, reconhecendo-se a mesma como um elemento essencial e disponibilizando-se o acesso a esta de forma continua (White, 2014, p. 6). Assim, a Mud Kitchen, uma área de interesse enquanto es- paço exterior, proporciona diversas aprendizagens ao ar livre associadas aos seus elementos naturais e às potencialidades de exploração dos mesmos. No entan- to, proporciona de igual forma o desenvolvimento de várias outras competências, como em termos de ne- gociação, cooperação, diálogo e partilha, fomentando experiências de interação ricas entre os intervenien- tes. Além disso, revela-se como uma zona em que se destacam as brincadeiras de roleplay, onde são fomen- tadas a criatividade e a imaginação, uma vez que nes- tas se fazem associação a contextos conhecidos pelas crianças, reproduzindo-se ações e modelos que lhes são familiares e relevantes (Bento & Dias, 2017, p. 187) (ver fotografia 13 e 14).


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Fotografia 13 e 14 – Crianças a cozinhar


Adicionalmente, o contacto das crianças com a terra, acaba por ser benéfico. As bactérias existentes no solo ajudam a desenvolver o sistema imunitário e na pro- dução de serotonina no organismo, sendo que muitas vezes o mal se encontra na exagerada desinfeção e não no contacto com germes benéficos (White, 2014, p. 25). Cabe ao adulto assumir o papel de facilitador tornando a cozinha disponível e apoiando as crianças nas apren- dizagens que desenvolvem neste espaço. A planifica- ção das atividades a realizar neste espaço também é fundamental, uma vez que promove todas as poten- cialidades do mesmo. O profissional de educação deve também observar o que decorre na Mud Kitchen, procu- rando compreender o que acontece e identificar a im- portância atribuída a este espaço pelas crianças. Com as conclusões que vai tecendo, provenientes de refle- xão e avaliação, o educador deve então procurar fazer ajustes na sua prática educativa de forma que toda a experiência concedida neste espaço seja relevante e significativa para as crianças (White, 2014, p.21).


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Considerações Finais

É necessário compreender, desde cedo, a importância do papel do educador de infância em contexto de Edu- cação Pré-Escolar. Este deve estabelecer relações afeti- vas seguras e de confiança com as crianças, envolven- do-as num clima de familiaridade e liberdade, onde seja possível à criança tomar a iniciativa para escolher temas e atividades, com o apoio dos adultos quando necessário. Nesta perspetiva, o educador deve apoiar as crianças nas suas explorações livres e na realização de atividades, de forma indireta, através da organi- zação de um ambiente educativo rico e encorajador, ou diretamente, interagindo com as crianças e par- ticipando nas suas atividades e brincadeiras. Assim, deve possuir um conhecimento vasto sobre as teorias que retratam o desenvolvimento da criança e imple- mentar um currículo adaptado a cada especificidade do contexto em que se encontra inserido.

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Observar, registar, organizar e avaliar a informação acerca das crianças e das suas experiências são, tam- bém, aptidões importantes que o educador deve deter para ser capaz de planear futuros momentos e ativida- des adequados e estimulantes.

As crianças necessitam de espaço para fazer explora- ções, criar, resolver problemas e usar objetos e mate- riais. É fundamental espaço para se moverem de forma livre e para falarem à vontade sobre o que estão a fazer. A forma como o espaço, interior e exterior se encontra organizado, quando é estruturado pela consistência, permite que a criança seja capaz de antecipar para onde quer ir e o que quer fazer com os materiais que lá exis- tem (Silva, Marques, Mata & Rosa, 2016). Para tal ser possível é necessário que o educador conheça as carac- terísticas do grupo e organize o espaço tendo em conta as mesmas, contribuindo assim para o desenvolvimen- to da aprendizagem das crianças, sendo necessário ter a capacidade de fazer ajustes sempre que oportuno e mediante as necessidades e os interesses do grupo.

É importante salientar que a educação se encontra em constante evolução, não sendo algo estático. Como de- fende Hannah Arendt (Arendt, 2000, p. 8): “(…) a edu- cação é uma das atividades mais elementares e mais necessárias da sociedade humana a qual não perma- nece nunca tal como é, mas antes se renova sem ces- sar pelo nascimento, pela chegada de novos seres hu- manos”. Assim, é fundamental compreender que a re- flexão, a planificação e a avaliação contínuas acerca do

espaço educativo frequentado e explorado pelas crianças permitirá ao educador de infância compreender e ajus- tar as suas ações ao desenvolvimento individual e coleti- vo do grupo. Tal contribuirá para alcançar uma prática educativa verdadeiramente diferenciadora e impactante no desenvolvimento pessoal e social das crianças.


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Referencias bibliográficas


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Filgueiras, M. S. C. (2010). O espaço e o seu impacto educativo: quais as principais características da gestão e organização do espaço sala em educação infantil. Universidade Aberta. Disponível em: ht- tps://core.ac.uk/download/ pdf/303040036.pdf.

Hohmann, M., Banet, B., & Weikart, D. P. (1984). A Criança em acção. Fundação Calouste Gulbenkian.

Hohmann, M. e Weikart, D. (2007). Educar a Criança. (4ª ed.). Fundação Caloustre Gulbenkian.

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Oliveira-Formosinho, J. (1998). A contextualização do mo- delo curricular High-Scope no âmbito do Projeto In- fância. In Oliveira-Formosinho (org.). Modelos Cur- riculares para a Educação de Infância. Porto Editora. Silva, I., Marques, L., Mata, L. & Rosa, M. (2016). Orientações Curriculares para a Educação Pré-Es-

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White, J. (2014). Orientações para fazer uma cozinha de lama. Cadernos de Educação Infância, 6-27.

Zabalza, M. A. (1992). Didáctica da Educação Infantil.

Edições ASA.

Zabalza, M. A. (1998). Didáctica da Educação Infantil.

Edições ASA.


Legislação


Decreto-lei nº 241/01 de 30 de agosto. Diário da Repú- blica nº 201/01 - I Série A. Ministério da Educação.

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