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S ABER & EDUCAR 31(2) / 2022: “100 ANOS DE PAULO FREIRE: PRÁTICAS, APRENDIZAGENS E PESQUIS AS”

E TU, O QUE ACHAS QUE É A ESCOLA?

Sara Paredes

Escola Superior de Educação do P. Porto


Pedro Duarte

1

Escola Superior de Educação do P. Porto


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Resumo:


A forma como pensamos escola e, consequente- mente, currículo, é influenciada por distintos posi- cionamentos éticos, sociais e pedagógicos, pelo tempo histórico em que vivemos, pelo contexto político-social-cultural em que nos inserimos, por princípios e crenças que revelamos, a experiên- cia pessoal em contextos escolares, os diálogos que desenvolvemos e a visão do mundo que construímos enquanto seres reflexivos (Duarte, 2021). Todavia, ao questionarmos regularmente a existência da institu- ição escolar, somos confrontados por simples respos- tas como “para guardar as crianças e entretê-las” e “para reproduzir a cultura estabelecida” (Coll et al., 2001, p.17). Com o propósito de analisar as perspe- tivas que as crianças do 1.º Ciclo do Ensino Básico têm relativamente ao que é a escola e quais as suas finalidades, desenvolveu-se um estudo de caso, to- mando como referência um Centro de Estudos. Neste trabalho, integraram-se duas técnicas de recolha de dados, micro-entrevistas individuais e entrevistas de grupo. Discute-se, em primeiro lugar, perante várias perspetivas do currículo e da educação qual ou quais as finalidades da escola, bem como explora-se de que forma o currículo texto revela implicações no currí- culo vivenciado, algo que assume uma dimensão im- plícita na conceção de escola que cada um constrói. De uma análise inicial, obtiveram-se respostas que privilegiam a natureza académica da realidade esco- lar, privilegiando opções como “estudar, aprender a ler e a fazer contas”. Tal postura dialoga com outros aspetos que são particularmente salientados pelas crianças, como as dimensões associadas ao ofício do aluno, à sociabilidade, ao edificado e a uma certa visão instrumental currículo.


Palavras-chave:

Escola, educação, currículo, Finalidades Educativas


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DATA DE RECEÇÃO: 2022/10/26

2

DATA DE ACEITAÇÃO: 2022/12/12

Abstract:


S ABER & EDUCAR 31(2) / 2022: “100 ANOS DE PAULO FREIRE: PRÁTICAS, APRENDIZAGENS E PESQUIS AS”

The way we think school and, consequently, curriculum, is influenced by different ethical, social and pedagogical positions, by the historical time in which we live, by the political-social-cultural context in which we are inserted, by principles and beliefs that we reveal, the personal experience in school contexts, the dialogues that we develop and the worldview that we build as reflective beings (Author, 2021). However, when we regularly question the existence of the school institution, we are confronted by simple answers such as “to guard children and entertain them” and “to reproduce the established culture” (Coll et al., 2001, p.17). With the purpose of analyzing the perspectives that elementary school children have about what school is and what its purposes are, a case study was developed, taking as reference a Learning Centre. In this work, two data collection techniques were integrated, individual “micro-interviews” and group interviews. First, we discuss, from various perspectives of curriculum and education, what the purposes of the school are, and explore how the curriculum text reveals implications in the curriculum experienced, something that has an implicit dimension in the conception of school that each one builds. From an initial analysis, answers were obtained that privilege the academic nature of the school reality, favouring options such as “study, learn to read and do math”. Such a position dialogues with other aspects that are particularly emphasized by the children, such as the dimensions associated with the student’s craft, sociability, the built environment and a certain instrumental view of the curriculum.


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Na Lei de Bases do Sistema Educativo (1986), enuncia-

-se que o principal objetivo da escola é criar mecanis- mos que visam responder às necessidades, de índole social, dos indivíduos, a fim de fomentar o desenvol- vimento saudável da sua personalidade e do seu espí- rito democrático, perspetivando a formação de cida- dãos livres, com espírito crítico e criativo, solidários e autónomos.

Na sequência do identificado, o Decreto-Lei n.º 54/2018 esclarece que o foco da atividade escolar é o currículo e as aprendizagens; para além disto, destaca a escola como inclusiva, orientada para o reconhecimento da diversidade e da diferença dos agentes como um valor intrínseco à experiência humana e educativa, numa procura constante de adequação dos processos de en- sino a cada comunidade e a cada identidade. Paralela- mente, o Decreto-Lei nº55/2018 ressalva que escola deve- rá contemplar a valorização de práticas que tenham em conta “a natureza transdisciplinar das aprendizagens”, criando oportunidades aos alunos de mobilizarem uma efetiva pluralidade de literacias e competências, possi- bilitando o desenvolvimento, tanto do conhecimento científico, como também da curiosidade intelectual, do espírito crítico e interventivo, da criatividade e do trabalho colaborativo.

Com o presente texto, procura-se avançar com os resul- tados de um pequeno estudo que tem como principal propósito compreender o modo como as crianças (1.º Ciclo do Ensino Básico) perspetivam as finalidades da escola e do currículo. Neste enquadramento, o documento encontra-se orga- nizado em cinco secções. Na primeira, discutem-se dis- tintos posicionamentos sobre a finalidade dos sistemas educativos. Na secção seguinte, avança-se com uma problematização do conceito e práticas curriculares. Na terceira secção, esclarecem-se as opções metodológicos e critérios de validade, de forma a enquadrar a recolha dos dados que são analisados na secção subsequente. Termina-se o documento com a indicação dos princi- pais resultados e conclusões desta investigação.

Finalidades

da Escola

Numa revisão ao conceito de educação, é de realçar o seu carácter polissémico, assumindo, por esta razão, múltiplas interpretações. Assim, Fullat (1983 citado por Boavida et al., 2008, p.160) alicerça a educação em três domínios – “como necessidade vital, como função social, como direção”, realçando as relações entre os fe- nómenos sociais e culturais. Apesar desta conceção, a verdade é que a forma como se constrói e perspetiva diferentes realidades educativas diverge, na maior parte, das ideias enunciadas, emergindo paradigmas e outros modos de pensar em educação e currículo.

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Um dos principais paradigmas que influenciou a prá- tica educacional formal foi o paradigma de ensino tra- dicional. Leão (1999) denuncia que a escola tradicional surgiu dos sistemas nacionais de ensino e a sua orga- nização inspirou-se nos pensamentos da sociedade burguesa emergente, que defendia a “educação como um direito de todos e um dever do Estado” (p.188). O ensino tradicional institui-se após a Revolução Indus- trial, com a necessidade de instruir as massas e inte- grou os sistemas nacionais de ensino, dando origem à escola básica, universal e gratuita como meio de per- petuação da ordem democrática (Pacheco, 2019). Em síntese, estabeleceu-se uma instituição de ensino ba- seada na instrução e transmissão de conteúdos, com vista à formação do cidadão disciplinado (Leão, 1999). A dimensão que a educação de massas tomou, no iní- cio do século XX, uma preocupação com as suas finali- dades, características e organização. Essas preocupa- ções são um elemento fundacional na obra “The Curricu- lum” de Bobbitt. Neste documento, divulgava-se uma cultura escolar focada nos resultados e para os resul- tados, numa ligação direta com o mercado de traba- lho, assumindo o desenvolvimento económico como a principal função da escola (Moreira et al., 2020; Tadeu da Silva, 2010). Para Bobbitt e outros curriculistas que subscreviam esta corrente de pensamento, a “escola [é entendida] como empresa comercial ou industrial” (Tadeu da Silva, 2010, p.23), construída “de acordo com o modelo da linha de montagem fabril” (Pinar, 2007 citado por Pacheco, 2019, p.15). Para além disto, a racionalidade tyleriana corrobora estes pressupos- tos induzindo a “administração universal da escola, a gestão científica do currículo e a formação técnica de professores” (Pacheco, 2019, p.14), ou seja, a instaura-

ção de uma perspetiva “técnica, burocrática e linear” (Tyler, 1949 citado por Pacheco, 2019, p.14), tendo como conceitos basilares: objetivos, conteúdos, atividade e avaliação (Tadeu da Silva, 2010).

Genericamente, a finalidade da escola de acordo com estes paradigmas, sejam eles educacionais ou curricu- lares, é de preparar os alunos em termos técnicos, in- telectuais e morais para o sucesso da economia global, fornecendo-lhes competências para o mundo do traba- lho, que são avaliadas de forma quantitativa e com vis- ta à obtenção de resultados (Pacheco, 2019). Encarar a escola desta forma conduz a uma desvalorização daqui- lo que acontece no interior das escolas e, consequen- temente, condiciona o desenvolvimento e construção da identidade de cada um, mas também da família, da comunidade e da própria escola (Moreira et al., 2020). Uma perspetiva contrastante com aquilo que a escola tradicional que Bobbitt, Tyler e outros teóricos pro- põem é o olhar de Isabel Alarcão. Alarcão (2001, p.9) assume que a “era industrial foi substituída pela era do conhecimento e da informação” e, por este motivo, como estamos perante mudanças de índole ideológi- ca, social, cultural e profissional, a forma como pen- samos educação também terá de mudar. Esta ideia é corroborada pela perspetiva Costa (2019), ao relembrar a revolução no modo como conseguimos obter informa- ção e, portanto, considera que as funções da escola de hoje terão, igualmente, de ser diferentes das preconi- zadas nos séculos XIX e XX. Por esta razão, salienta o cultivo do pensamento crítico, analítico e criativo; dos direitos e deveres de cidadania; da resolução de proble- mas; da autonomia, consciência e sensibilidade em sociedade e da responsabilidade individual. Assim, os maiores desafios da escola são garantir melhores e mais significativas aprendizagens de todos (Costa, 2019).

Ao retomar os contributos de Alarcão (2001), a autora esclarece que as escolas contemporâneas contemplam três realidades: um espaço, um tempo e todo um con- texto de aprendizagem e desenvolvimento. A par des- tas características, existe uma condição intrínseca à escola que esta autora projeta - a reflexão, expondo que a escola como organização, terá que constante- mente pensar e avaliar a si própria, o seu projeto so- cial e a sua gestão em termos organizacionais. Para além disto, esclarece que a escola é uma “organização aprendente que qualifica não apenas os que estudam, mas também os que ensinam e apoiam outros” (Alar- cão, 2001, p.15), expressando a preocupação com os di- versos agentes que nela interage. Assim, a principal função assumida pela escola será organizar contextos de aprendizagem, exigentes e estimulantes, que po-

tenciem atitudes saudáveis e o nascer de capacidades inerentes ao desenvolvimento de competências ne- cessárias à convivência, interação e intervenção ativa com os outros cidadãos (Alarcão, 2001). Por fim, Alar- cão (2001), do mesmo modo que Dewey (1897 citado por Moreira et al., 2020), entende a escola e a educa- ção como a própria vida, não somente a preparação de cidadãos para um futuro. Tal como reforçam Moreira e colaboradores, (2020, p.2) “a educação não pode ser conceptualizada como uma alavanca para o futuro, antes tem de ser enquadrada enquanto modo de pos- sibilitar que cada um viva, da melhor forma possível, o presente”.

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Para além destas posições, é importante destacar a sua relação com a formação cultural, no sentido da “promoção das relações sociais e da afirmação do in- divíduo no seio da comunidade” (Giroux, 2011 citado por Moreira et al., 2020, p.3), algo intimamente re- lacionado com o que a conceção socio-construtivista propõe, “desenvolvimento humano é um desenvol- vimento cultural contextualizado” (Coll et al., 2001, p.12), bem como com a teoria multicultural do currí- culo, que admite a existência de uma implicação da cultura, em que nos inserimos e que construímos, nos contextos educativos (Tadeu da Silva, 2010).

Ao contemplar um olhar intimamente social acerca da educação escolar, Coll e colaboradores (2001) enten- dem a escola como um “projeto social que ganha corpo e se desenvolve numa instituição, também ela social” (Coll et al., 2001, p.12). O mesmo texto indica que uma escola de qualidade será aquela que terá a capacidade de disponibilizar, para cada aluno, o currículo que ele necessita para se desenvolver, realçando, deste modo, a atenção que deverá ser dada a cada um para que pos- sa evoluir em termos pessoais, sociais e cognitivos. Tal posicionamento converge com o entendimento de Matos Vilar (1994), em particular quando o autor faz sobressair o currículo como um projeto cultural que esclarece uma das finalidades maiores da escola, a preservação e divulgação de cultura.

Para terminar, recupera-se a perspetiva de Pacheco (2019). O autor alerta para distintas responsabilidades da instituição escolar, no que concerne à concretiza- ção de ideias democráticas, como também no projeto de justiça social. Defende, ainda, que a escola seja um espaço de trabalho do conhecimento, pelo que terá, dentro da sua unicidade e especificidade, que atuar na diminuição das desigualdades escolares, não re- duzindo o seu projeto pedagógico a uma ferramenta burocrático-instrumental.


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Centralidade

do currículo na definição da(s) finalidade(s) escolar(es)

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Decorrente das perspetivas mais tradicionais, já su- mariamente apresentadas, o conceito de currículo tende a circunscrever-se a um raciocínio focado so- mente nos documentos curriculares e na gestão, por exemplo, do horário ou das disciplinas. Porém, se- gundo Duarte (2021), existem definições que apoiam a discussão acerca do conceito de currículo, sendo, para esta investigação, importantes os conceitos de “currí- culo texto ou prescrito” e “currículo real ou vivencia- do”. O primeiro remete para o acervo de orientações curriculares publicadas pelos órgãos políticos, que em Portugal assume-se como currículo nacional – “ponto de partida para qualquer experiência pedagógica e como ponto de chegada expectável para a aprendizagem de qualquer educando” – (Duarte, 2021, p.52). Por outro lado, o currículo vivenciado, tal como o nome suge- re, remete para a dimensão das relações humanas e, portanto, das experiências que os agentes escolares vi- vem, assumindo-se como “a totalidade da experiência pedagógica” (Duarte, 2021, p.54). Pacheco (2019, p.13), encara o currículo vivenciado como a partilha de sig- nificados pessoais, no “reconhecimento da subjetivi- dade, multiplicidade e singularidade”. Por seu turno, Aoki (2005) esclarece a prática curricular e o currículo real como algo que contempla as particularidades do contexto educativo, do meio local e estratégias forma- tivas, enquanto se baseia nas ações e reações dos do- centes e dos alunos.

Perante a realidade nacional, é de sublinhar que exis- tem ainda certos princípios de educação que emergi- ram da escola tradicional, discutida no capítulo ante- rior, como é o caso do primeiro descritor do artigo 2. da Lei de Bases do Sistema Educativo (1986): “Todos os portugueses têm direito à educação e à cultura, nos termos da Constituição da República. Para Canha (2021), urge como necessária uma mudança na forma de pensar educação e escola, já que o olhar sobre es-

tas dimensões é condensado na imagem de um local de transmissão, por parte do professor, e aquisição, por parte do aluno, do conhecimento. Para este autor (2021), uma alteração no currículo texto influenciará a construção do currículo vivenciado, e em consequên- cia, no modo como perspetivamos escola.

A este propósito, o Decreto-Lei n.º54/2018 estabele- ceu a garantia da escola como inclusiva, expressando que esta será “onde todos e cada um dos alunos, inde- pendentemente da sua situação pessoal e social, en- contram respostas que lhes possibilitam a aquisição de um nível de educação e formação facilitadoras da sua plena inclusão social”, o que a par de outros refe- renciais do currículo nacional, como é caso Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, demarca- ram-se pela carga de mudanças que preconizam em termos organizacionais e da forma como se descrevem os processos educativos. Estas alterações nas políticas centrais terão impacto no modo como pensamos e pra- ticamos as ações em ambientes escolares, com efeito, igualmente, na construção do conceito de escola, pe- las crianças.

Para além disso, ao focar a dimensão que o currícu- lo texto adquire, é possível afirmar que os conteúdos, identificados como basilares nas Aprendizagens Es- senciais são um espelho dos aspetos culturais “social- mente dominantes” (Tadeu da Silva, 2010, p.88) que se ditam cruciais aprender para o desenvolvimento do aluno e que, portanto, acabam por se preconizar (Pacheco, 2019; Tadeu da Silva, 2010). Com base nes- te conhecimento, é importante questionar a forma como o currículo texto é elaborado, tendo em conta que este deverá “incluir uma amostra que fosse mais representativa das contribuições das diversas culturas subordinadas” (Tadeu da Silva, 201, p.88), que pro- porcione tanto alunos como professores o questionar e o debater de certas temáticas, não perpetuando de- terminados estereótipos. Este é mais um exemplo de como determinadas mudanças no corpus do currículo prescrito potenciam alterações na(s) formas de pensar e, consequentemente, agir – por outras palavras, cau- sar modificações nas dinâmicas do currículo vivencia- do (Tadeu da Silva, 2010).

Tal como já referenciado por Duarte (2021), quando se estuda as experiências vivenciadas em contextos esco- lares, não se pode ter somente em conta lógicas nor- mativas. Assim, apesar das alterações recentes que foram descritas e que inspiram à mudança na forma de pensar e agir, o currículo real contempla também dimensões de carácter experimental, individual e co- letivo, numa implicação direta com o contexto especí- fico onde surge. O mesmo autor enumera que certas

práticas pedagógicas, inerentes ao currículo vivencia- do, são mais complexas de desconstruir, uma vez que estão enraizadas na forma de agir e pensar educação – “lógicas de desconsideração cultural de determina- dos grupos sociais, a desvalorização das experiências e dos saberes quotidianos dos alunos, a perpetuação de rotinas homogeneizantes” (Duarte, 2021 p.66). As dinâmicas escolares, integradas na visão de currícu- lo real, para se assumirem como processo educativo, terão de ir além da instrução ou do desenvolvimento de competências, perspetivando o “crescimento global de cada estudante, ou seja, a sua formação cultural e a sua maturação ética” (Duarte, 2021, p.99). Para com- pletar esta ideia, Pacheco (2019) alerta que os modos de pensar a escola e as suas finalidades são, igualmen- te, influenciados por esferas sociais mais abrangen- tes, nomeadamente sondagens de opinião ou certos estudos que são projetados pela comunicação social.


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Enquadramento

Metodológico

À semelhança do que já se identificou, o principal pro- pósito da pressente investigação é compreender o modo como as crianças (do 1.º Ciclo do Ensino Básico) perspetivam as finalidades da escola e do currículo. Decorrente de tal postu- ra, definiram-se três objetivos particulares:

  1. Entender o modo como as crianças que frequen- tam o 1.º CEB perspetivam a organização esco- lar;

  2. Perceber a perspetiva das crianças que frequen- tam o 1.º CEB sobre as finalidades da escola;

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  3. Analisar as conceções implícitas das crianças que frequentam o 1.º CEB sobre o currículo, nes- te nível de ensino.


Tendo em consideração os propósitos definidos, dese- nhou-se um estudo de caso: um estabelecimento de cen- tro de estudos. Decorrente de tal escolha, participaram 19 crianças que frequentam o mesmo centro de estudo, no Norte do país. À semelhança do que esclarece Amado (2017), assumimos o estudo de caso visam uma análise predominantemente interpretativa dos fenómenos em estudo. Esclarece-se, ainda, que a seleção deste caso decorreu de dois critérios diferentes. Por um lado, pela conveniência dos investigadores, o que possibilitou uma recolha de dados progressiva, dado que um dos autores já conhecia as crianças o que facilitou a interação entre investigadores e participantes. Por outro lado, facilitou a participação de crianças que frequentam diferentes anos letivos e diferentes estabelecimentos de ensino.

Dado o estudo, optou-se por dois momentos de recolha de dados – micro-entrevistas individuais e a entrevista de grupo (focus group). Ambas as técnicas são “próprias de uma investigação do tipo qualitativo” (Bogdan & Bi- klen, 2006 citados por Moreira et al., 2020, p.11). Numa primeira fase, estabeleceu-se diálogos informais indi- viduais com base nas seguintes questões: “E tu, o que achas que é a escola?” e “Para que serve a escola, en- tão?”, procedendo ao registo das respetivas respostas e da idade da criança em questão. Com esta abordagem, a principal finalidade foi aceder mais facilmente aos pré-conceitos intuitivos que as crianças manifestam no que concerne a este tema. Sobre este aspeto, desta- ca-se a perspetiva de Amado (2017) que defende a pos- sibilidade de se incluírem, em estudos em educação, diferentes tipos de dados, mesmo aqueles provenientes

de processos informais, como diálogos.

Numa segunda fase, a técnica adotada foi o focus group, técnica de recolha de dados baseada na interação, cuja fonte principal de dados é a discussão de um grupo sobre uma certa temática (Silva et al., 2014). Com a aplicação desta estratégia, as crianças foram levadas a pensar, num grupo de quatro elementos com idades distintas, quais as definições que apresentam sobre escola, bem como a confrontar as suas perspetivas relativamente às funções deste organismo (Silva et al., 2014). Assim, foram colocadas perguntas idênticas às já enunciadas: “O que é a Escola para ti?” e “Para que serve a Escola, na tua opinião?”, a partir das quais se iniciou a parti- lha de experiências, conceitos e representações entre a amostra de estudantes do 1º CEB. Não se pretendia que as crianças chegassem às mesmas conclusões, simples- mente que observassem a existência de diversas pers- petivas sobre o que é a escola.

Apresentação e

análise dos dados

Como identificado em 3., o presente estudo optou por uma análise de conteúdo. Decorrente desta opção, após a leitura das respostas das crianças – em particular quan- to questionadas com perguntas como: “E tu, o que achas que é a escola?” e “Para que serve a escola” – estabelece- ram-se cinco categorias emergentes que orientaram a análise que se segue: (i) Centralidade da aprendizagem; (ii) Im- portância da sociabilidade; (iii) Conceção da escola como edifício; (iv) Influência do ofício do aluno; (v) Entendimento utilitário da escola. De salientar que certas categorias revelam subcategorias a elas inerentes, como se constata pela seguinte tabela. A associação da escola à aprendizagem foi estabeleci-


Categoria

Frequência Absoluta

Frequência Relativa

1. Centralidade da aprendizagem

40

44%

1.1. Relevância do estudo

13

33%

1.2. Hierarquização dos conhecimentos

8

20%

1.3 Relação com o futuro

5

13%

1.4. Aprendizagem

1

1%

2. Importância da sociabilidade

36

40%

2.1 Brincar

14

39%

2.2 Relações interpessoais

9

25%

2.3. Qualificação positiva

8

22%

2.4. Liberdade

1

3%

2.5. Sociabilidade

4

11%

3. Conceção da escola como edifício

7

8%

4. Influência do ofício do aluno

5

5%

5. Entendimento utilitário da escola.

3

3%

Tabela 1. Frequência absoluta e relativa dos dados de cada categoria e sub-categorias (autoria própria)


Por fim, importa esclarecer os critérios de validade considerados. Tomando, uma vez mais, as propostas de Amado (2017), destacam-se três critérios conside- rados. A triangulação de técnicas, através da articu- lação de dados provenientes das micro-entrevistas individuais e do focus group. A credibilidade teórica, re- lacionada com o diálogo sistemático entre o material empírico com outros trabalhos de natureza científica. E, por último, a credibilidade descritiva, com a mobi- lização, recorrente e transparente, das respostas das crianças que participaram na investigação.


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da em 44% das respostas. Para além do mencionado, importa assinalar que na maioria das respostas, as palavras do campo lexical de aprendizagem surgem em primeiro lugar nas respostas das crianças, como se evidencia pelos seguintes excertos:

“Estudar, divertir, brincar com os amigos” (C11); “Um sítio onde se aprende, onde se conhece pes- soas novas, onde se aprende a ler e a escrever e a fazer contas” (C2);

“A escola para mim é aprender, fazer amizades, ter amigos. É um sítio para aprender, é para ser divertida” (C3);

“Porque a escola é para aprender” (F19).


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1 – A nomenclatura adotada respeita a seguinte legenda: Cx – respostas provenientes das micro-entrevistas; Fx – respostas provenientes do grupo focal. A utilização de algarismos está relacionada com a criança a partir da qual se obteve os dados.

Por outras palavras, estudar, que representa 33% das respostas dadas nesta categoria, é um vocábulo que as crianças associam de imediato quando pensam em escola, sugerindo, igualmente, ser uma das ações que mais praticam neste ambiente. O conteúdo des- tas respostas reflete uma desvalorização, cultivada no contexto educativo, de outras dimensões (social, psicológica, emocional, etc.) em virtude da dimensão científica, o que converge com o que foi já identificado por Moreira e colaboradores (2020).

Paralelamente e com a mesma percentagem (33%) evi- dencia-se o olhar sobre a escola como contexto que per- mite a aprendizagem de algo que ainda não tinham conhecimento sobre – associada à ideia de ampliação cultural – como se evidencia pelos seguintes excertos: “É uma coisa para trabalhar, para aprendermos

coisas novas.” (C4);

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“Para nós aprendemos coisas que ainda não sa- bíamos.” (C5);

“Para aprendermos coisas novas.” (C11).


Assim, a escola é entendida como um espaço cultural onde é possível a cada criança ampliar os seus conheci- mentos. Tal perspetiva, pelo menos de forma implíci- ta, aproxima-se da ideia de Vilar (1994), em particular quando o autor centraliza o currículo como um projeto cultural, que se estabelece como um dos dois princi- pais eixos da finalidade dos sistemas educativos.

Alerta-se, ainda, a existência da ideia de que há áreas disciplinares mais significativas, constatando-se, por exemplo, na forma como a maior parte das crianças organizou a sua resposta o que evidencia, por parte dos inquiridos, uma hierarquização dos saberes, pelo menos de forma implícita:

“Para estudar e também aprender Matemática, Português e Estudo do Meio.” (C6);

“Estudar, aprender Matemática e Português e lermos.” (C7);

“Para aprender Matemática, Português e Estudo do Meio.” (C8);

“Aprendo contas, a ler, escrever e aprendo tam- bém os sinais de trânsito.” (F5).


A Matemática, o Português e o Estudo do Meio são as componentes curriculares maioritariamente mencio- nadas e, para além disto, surgem múltiplas vezes pela ordem acima indicada transmitindo a ideia de que a Matemática e o Português revelam maior importân- cia em virtude das restantes áreas. Esta visão poderá ser explicada devido à carga horária semanal definida pelo Decreto-Lei n. º55/2018, no qual a Matemática e o

Português ganham um maior destaque com sete horas semanais cada, sendo que as restantes áreas curricula- res comportam menos horas. Assim, a hierarquização de saberes representa 20% das respostas dadas da cate- goria Aprender. De salientar que somente uma criança fez referência a outras áreas curriculares para além das três anteriores - “Para aprender as matérias de Matemá- tica, Português, Estudo do Meio, Artes e Inglês.” (C3). Relativamente ao que se analisou, Pacheco (2019) de- nuncia tendências contemporâneas, em grande medi- da apoiada por diferentes organismos transnacionais como a OCDE ou o Banco Mundial, que (praticamen- te) reduzem a função social da escola à preparação dos alunos para o sucesso da economia global, numa rela- ção direta com a teoria do capital humano, que enal- tece a centralidade do desenvolvimento de competên- cias úteis, em especial na sua dimensão económica e laboral. Este olhar sobre escola é corroborado pelas seguintes respostas das crianças (13% das respostas da categoria Centralidade da aprendizagem) que expressam uma relação escola-futuro:

“(…) porque é preciso para o futuro saber Matemáti- ca, Português.” (C9);

“É um sítio onde as pessoas aprendem coisas quan- do são pequenas e quando formos maiores vamos utilizar uma das coisas que aprendemos.” (C11); “Para aprendermos, nos divertirmos. Para a gente ser gente no futuro.” (C10);

“(...) Preparar para quando formos grandes.” (C3).


Através destes exemplos, é possível destacar que as crianças observam a aplicabilidade, utilidade e im- portância da escola numa perspetiva futura, como se de uma etapa de preparação para esta fase se tratasse, divergindo, por exemplo, do que é defendido por Mo- reira e colaboradores (2020).

Num sentido complementar, as questões da sociabili- dade surgiram de uma forma inerente ao pensamen- to sobre aquilo que é a escola e quais as suas funções. Ainda que a ordem discursiva pareça evidenciar uma certa secundarização da dimensão social subjacente à experiência escolar, este aspeto é mencionado por 40% dos inquiridos. Igualmente destacamos que, dentro desta categoria, há uma representação expressiva de (39%) de menções associadas ao brincar. Esses aspetos ficam evidentes nos seguintes excertos:

“Estudar, brincar, comer porque tem cantina” (C13); “Serve para aprendermos muitas coisas, para es- tudar, brincar, ir à cantina e lanchar.” (C14);

“O que é que maioritariamente fazes na escola? (Investigadores)

Eu escrevo, eu brinco, eu como e acho que é tudo.” (F10).


Há, também, uma percentagem de dados associados às relações interpessoais (25%), nomeadamente de amizade, existindo respostas que denunciam que é na escola que fazem amigos novos e que fortalecem laços com os que já têm.

“A escola para mim é aprender, fazer amizades, ter amigos. É um sítio para aprender, é para ser divertida.” (C3);

“Na escola faço novos amigos e ainda faço um laço mais forte com os que já tenho.” (C5);

“Para mim, eu acho que a escola é uma institui- ção que aprendemos, temos muitos amigos e é o que nos faz feliz.” (F8);

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”É boa, porque tenho muitos amigos” (F13).


Manifestam, deste modo, o reconhecimento da compo- nente social intrínseca à escola e aos fenómenos educa- tivos. Tal perspetiva dialoga com o trabalho de Moreira e colaboradores (2020), em especial quando os autores alertam sobre a necessidade da “socialização entre pares seja valorizada e promovida precisamente no contexto escolar, reconhecendo-se assim a sua significativa im- portância na vida das crianças e na sua educação” (p.19). De destacar que, mais concretamente quando confron- tados com a questão “O que achas que é a escola?” mui- tas das crianças, nas micro-entrevistas e no focus group responderam atribuindo características consideradas positivas como “Fixe” (C15; C9); “Boa” (C8; C19; F13); “Muito feliz” (C18); “Muito fixe” (C6); “É o que nos faz feliz” (F8); “A escola é divertida” (F8) o que contrapõem a conceção social de escola. É ainda, importante enfa- tizar a seguinte afirmação “Sítio livre para nós brincar- mos” (C15), dado que ressalta a imagem de que o espaço escolar pode representar liberdade e dar a oportunida- de de expressão às crianças. Contudo, na entrevista de grupo a qualificação negativa atribuída à escola surge nomeadamente em questões sociais na relação com as assistentes operacionais – “As funcionárias são más, não fazem nada” (F2) e “As funcionárias só gritam com eles (com as crianças que comem mais devagar) e se dessem um privilégio de tempo para eles comerem em vez de estarem sempre a gritar” (F5).

Apesar das transformações que a escola sofreu nos últimos anos devido à pandemia, passando de um formato presencial para um formato a distância, 8 % das respostas das crianças revelam uma associação da escola a um espaço, usando expressões como sítio, lu- gar, edifício e instituição.

“Um sítio para estudar” (C16);

“Um sítio onde se aprende, onde se conhece pes- soas novas, onde se aprende a ler e a escrever e a fazer contas.” (C2);

“Um edifício. Sítio de aprender, conviver com os amigos e fazer amigos novos.” (C13);

“Para mim, eu acho que a escola é uma institui- ção que aprendemos, temos muitos amigos e é o que nos faz feliz.” (F5);

“Se queremos uma escola ideal temos de melho- rá-la e também precisamos de uma cozinha me- lhor.” (F9).


Deste modo, compreende-se que as crianças interpre- tam os fenómenos educativos como circunscritos ao espaço/edifício da escola. Nesse sentido, mesmo que, à semelhança de Duarte (2021) se reconheça que a es- cola, também na sua dimensão arquitetónica, é um eixo estruturante para a compreensão dos fenómenos curriculares, alerta-se para o modo como as crianças inquiridas parecem fazer sobressair as particularida- des do edificado, quase que reduzindo a escola à sua dimensão física.

Por outro lado, 5 % das respostas dos alunos estão in- timamente ligadas à visão de escola como trabalho, como um ofício. Perrenoud (1995) denuncia que “exer- cer um ofício, ter um trabalho, é uma forma de se ser reconhecido pela sociedade” (p.15), contudo o mes- mo autor defende que num universo ideal o ofício do aluno seria aprender. Porém, as respostas dadas pe- las crianças espelham uma naturalidade associada à ideia de escola como trabalho:

“Trabalhei muito na escola.” (C17);

“É uma coisa para trabalhar, para aprendermos coisas novas. Quando acaba as aulas, brincamos um bocadinho no recreio.” (C4);

“Para aprender as matérias de Matemática, Por- tuguês, Estudo do Meio, Artes e Inglês. Fazer amizades. Trabalhar bem. Preparar para quando formos grandes.” (C3);

“Porque gosto de trabalhar. (F19)

“Concordo com o F19, porque ele é na sala lá em cima e trabalha muito.” (F13).


Este olhar poderá ser justificado pelo facto de as ações no ambiente escolar serem, por vezes, mecânicas e re- petitivas, como se de uma fábrica se tratasse. De igual modo, podemos constatar uma certa transposição de conceitos próprios dos contextos laborais para o meio escolar e, através dele, para o modo como cada criança se interpreta enquanto sujeito. Aqui, importante su-

blinhar que o desempenho que a criança revela no que considera o seu ofício acaba por condicionar o auto-

-conceito que constrói – “Eu vou ter teste de Estudo do Meio, eu sou bom a estudo do Meio, mas sou mau a Mate- mática e Português.” (C14). Deste modo, podemos igual- mente concluir que a escola é um espaço de construção de identidade condicionada pelo desempenho que o aluno revela nas diferentes componentes curriculares.

Por fim, muito ligado ao facto de as crianças passarem mais horas no espaço escolar, cerca de 3% das respos- tas obtidas denuncia um carácter utilitário da escola. Desta forma, há um transbordamento das tarefas as- sumidas pela escola e por necessidade social associa-

-se a esta a função de alimentação e de acolhimento: “Estudar, brincar, comer porque tem canti- na.” (C13);

“Quando os nossos pais não podem estar con- nosco, vamos para a escola.” (C2).


De algum modo, esta perspetiva dos estudantes dialo- ga com o trabalho de Moreira e colaboradores (2020), quando, no seu estudo, os inquiridos associaram que a escola era uma segunda casa.


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Considerações

Finais

Tendo em consideração a análise dos dados realizada é possível afirmar que foi possível compreender como é que as crianças (inquiridas) perspetivam as finalidades da escola. Nas suas respostas, estão demarcados tanto aspetos relacionados com características de um para- digma de ensino tradicional, bem como com uma cons- ciência do carácter social e cultural da escola.

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Por um lado, é natural à associação que as crianças esta- belecem entre a escola e a aprendizagem. Contudo, esta aprendizagem surge associada a lógicas de trabalho e “obrigação”, intimamente ligadas ao tipo de tarefas que desenvolvem (potencialmente repetitivas e mecânicas). Para além disto, é notória a importância que atribuem a certas componentes curriculares (Matemática, Por- tuguês e o Estudo do Meio), as quais são privilegiadas em determinadas situações de aprendizagem. Dado o mercado de trabalho, estas lógicas de hierarquização do conhecimento podem estar associadas à ideia de escola como preparação para o futuro. Este olhar sobre escola é semelhante àquele que Tadeu da Silva (2010) discute - uma cultura escolar focada nos resultados com a finali- dade de assegurar a atividade económica – como caracte- rística do paradigma tradicional.

Em contrapartida, existe uma valorização da intera- ção social no espaço educativo, nomeadamente no que concerne às relações de amizade, mas também aos momentos de ludicidade. É de salientar que as crianças restringem os processos de ensino e de apren- dizagem à sala de aula, pois nas respostas é clara a distinção entre os momentos que são para estudar e aprender e os restantes (que são para brincar e estar com os amigos), não considerados como motivadores de aprendizagem.

Por esse motivo, podemos constatar que as perspetivas das crianças sobre a escola e a sua finalidade integra um conjunto diverso de correntes de pensamento, estabelecendo-se como um olhar matizado e integra- dor de formas plurais de entender a realidade escolar. No discurso das crianças, sobressai ora um entendi- mento burocrático-instrumental, quando o foco é, predominantemente, a dimensão formativa, ora um entendimento humanizador do fenómeno, quando se atentam as relações entre as crianças e com o espaço que frequentam (e onde brincam).

Os dados recolhidos são poucos tendo em consideração

o número de alunos de 1.º Ciclo do Ensino Básico, con- tudo suscitaram interrogações: Não será preocupante termos crianças que não observam as potencialidades da escola no presente? Será que queremos realmente que a aprendizagem cultivada na escola seja somente de carácter científico? São estas algumas das questões que nos emanam e poderão servir de motivo para ou- tras investigações.

Para além referido, o presente artigo parece eviden- ciar a importância de se continuar a estudar a perspe- tiva das crianças sobre as finalidades escolares. Em in- vestigações futuras, pode-se, por exemplo, aumentar a amostra de participante e/ou acompanhar um grupo desde o 1.º ano de escolaridade até ao seu 12.º ano, ob- servando o modo como as finalidades e a perceção so- bre a realidade escolar destes alunos muda.


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